A definição de amor é-nos, de algum modo, simultaneamente clara e cara. Clara porque instintivamente cremos ter conhecimento, dentro de nós, sobre o ângulo do eixo em torno do qual gira o conceito, e qual a sua consistência e cheiro – a sua essência. Cara por nos ser tão difícil transpor tal noção para palavras, para uma delimitação hermética e definitiva da ideia (e não ousemos pensar nas ideias como aglomerados sinápticos, ou estaremos (ainda mais) fodidos - perdão). Tantos poetas, pensadores e trabalhadores da construção civil procuraram, além de exprimir, definir o amor (leia-se, pela não nomeação de nenhum desses indivíduos, a minha falta de cultura, que espero perdoável). Com sucesso? Todos eles, na expressão do amor. Provavelmente, nenhum na definição. Mas não nos alonguemos, ou parecerá que temos uma opinião formada sobre o assunto, e como se sabe é tal facto perigoso para a nossa integridade física.
Assim de chapa, Que o amor é uma convenção social.
Ultrapassado o inchaço dos globos oculares, podendo a pele retomar a sua posição original, disposta hierarquicamente segundo o desenho das rugas, ordenadamente envolvendo as feições (nota-se talvez alguma tensão ainda, uma crispação, um tremelique - baixe a sobrancelha, minha senhora, ouça-me), e após um coçar desesperado da zona lombar direita (até onde chega a minha mão, sempre insuficientemente longe), acalmemos o espírito.
Não é uma conclusão de génio (dado que não é minha, e não só por essa razão), mas não estamos habituados a ouvi-la, e, admitamos, sentimos alguma repulsa por ela. Nojo. Asco. Repugnância. (Os dicionários costumam dar jeito para estas enumerações pouco frutíferas). Mas, sobretudo, numa primeira fase, incredulidade. Numa segunda fase, pelo contrário, sente-se sobretudo incredulidade. É na terceira que tudo muda, devido a uma acumulação exagerada deste substantivo. Para que é que muda, desconheço.
Se pensarmos no Homem e lhe retirarmos a cultura (na sua forma original, ou seja, sob a forma das redes, interiores e exteriores a ele, por ele estabelecidas) – desafio-vos a fazê-lo, uma vez que não sou dotado de tão elevado nível de abstracção – sobra-nos um animal. Aliás, aproveito para dizer, somente porque fica bonito, que aquilo que distingue o homem do animal é a cultura (e quem diz cultura diz um sem-número de outras algaraviadas, variações sobre um mesmo tema). Consideremos este Homem aculturado, e ponhamo-lo defronte de uma mulher (não se aplica aqui a maiúscula, as minhas desculpas) por quem sentiria amor se de um Homem normal se tratasse. Pois, nada mais que atracção física amor carnal sexo instinto nas suas veias.
Reflictamos mais – faz bem, dizem. Não é imutável, o amor. Não é. A nível pessoal, temporal, geografico-espacial, e noutro tipo de níveis não necessariamente com a mesma terminação mas com a mesma aparência de domínios sérios e compactos. Isso é óbvio – nem sempre, ao longo da história, o nível de enroscamento público de pares de namorados roçou tanto a prática sexual. Nem sempre os casamentos assentaram em relações de amor. Nem sempre os núcleos familiares utilizaram essa grandeza (ofendamo-lo assim, ao amor… depravados!) como, ao mesmo tempo, combustível e alicerce dos agregados. Pequenos exemplos, que devido à sua condição de pequenos e de exemplos são ínfimos na sua representatividade, mas suficientes para os meus humildes intentos.
Conclui-se portanto, no que toca a este assunto, que a convivência interpessoal (há outras, sim, há outras) originou o amor como necessidade organizativa das sociedades, numa primeira instância, como complemento da sexualidade básica e instintiva. Como tal, o amor é, necessariamente, artificial. Por favor (agora sou eu quem pede), inflijam-me diversos tipos de dor física, a bem da minha sanidade. Não quero o amor artificial. O amor não é artificial. Pois não (aleluia), pois não. Porque a nossa realidade deixou de ser mensurável ao nível individual, e dê-se graças a Deus (lá iremos). O que sou funde-se com o que somos de um modo que leva a que a fronteira entre o natural e o artificial se defina, em parte, naquilo que é, na minha relação como o outro, aceite como um processo necessário para o entendimento e funcionamento desse e dos outros elos a que pertencemos.
Desta safei-me.
Com Deus, arrisco, o mesmo se passa. E não mais me alongo, por não querer tornar a referir as moléstias físicas que de uma prolongada reflexão sobre o assunto podem advir. Sendo católico, por herança cultural, hereditária e, espero (não possuo certezas, estou em construção), por convicção pessoal, e não questionando com esta exposição a existência ou não de Deus – quem sou eu, afinal – admito que as teorias são conjugáveis: a de que Ele existe e a de que nós O criámos. O que também não é nada de novo.
quarta-feira, 30 de abril de 2008
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